Em plena época de Páscoa, nem todos os coelhos têm a vida mansa de distribuir ovos de chocolate por aí.
Rusty Rabbit é um metroidvania com um protagonista de aparência fofinha, mas em um lugar bastante inóspito.
O rei da sucata
Stamp é um coelho que já está em uma idade adulta, sendo considerado até velho por alguns. A Terra em que vivia foi abandonada pelos humanos e, inesperadamente, os lagomorfos foram a espécie que evoluiu a ponto de se tornar dominante do planeta que agora estava totalmente destruído. As ruínas deixadas para trás ganharam aura de um lugar sagrado, que foi batizada de “Montanha Fuliginosa”.
Apenas alguns poucos corajosos se aventuraram a escavar os destroços e entulhos deixados para trás, e eles foram chamados de “escavadores de ferrugens”, pois a Montanha Fuliginosa nada mais era do que grandes construções, como fábricas, usinas, submarinos e laboratórios, que viraram pilhas abandonadas de entulho.
O lixo virou luxo e logo uma comunidade se estabeleceu em um ponto do planeta coberto de neve. É lá que vive Stamp e os demais habitantes. Por ser um escavador experiente, seu maquinário não é dos mais avançados, mas ele aguenta muito bem o tranco ao avançarmos pelas fases. O seu mecha é a principal ferramenta para destruir blocos de entulho, enfrentar robôs inimigos pelo caminho e juntar diversos objetos que podem servir como moeda de troca para melhorar suas habilidades e equipamentos.
Cada uma das áreas que podemos explorar usa o elemento do backtracking, bastante característico dos metroidvanias. Ou seja, nós avançamos pela aventura e sempre que uma nova habilidade ou ferramenta for desbloqueada, um novo trecho de um lugar que já foi visitado pode ser desbloqueado, abrindo um novo caminho que pode ter boas recompensas ou até inimigos mais fortes.
No quesito jogabilidade, temos pontos que pesam bastante tanto positivamente quanto negativamente. Falando da parte boa primeiro, a edição e seleção de habilidades do mecha é bastante variada. Temos uma árvore de skills, que é aprimorada com pontos ganhos ao subir de nível e completando missões paralelas, como exterminar uma quantidade específica de um tipo de inseto-robô, por exemplo.
Porém, não adianta ficar repetindo os mesmos trechos exaustivamente para “farmar” pontos de experiência e ficar absurdamente forte já no começo do jogo. Você irá adquiri-los normalmente, mas a árvore de habilidades vai sendo desbloqueada ao derrotarmos os chefes de cada área. Logo, só é possível estar completamente maximizado perto do final.
Também encontramos itens especiais pelo caminho, ou dados por algum NPC, que aumentam a capacidade do nosso veículo-escavador em assimilar componentes que melhoram sua força, defesa e velocidade. Além disso, seu braço direito pode revezar quatro tipos de equipamento: brocas, para escavar; armas de fogo, para inimigos com escudos; picaretas, para blocos e estruturas mais resistentes; e facões, para cortar cabos e qualquer outro tipo de objeto que bloqueie o caminho e não possa ser perfurado.
Ter tudo isso à disposição é uma ótima sacada de aumentar o fator replay, principalmente ao voltar nas fases iniciais para explorar cada canto disponível do mapa, mas aí esbarramos na física de Rusty Rabbit, que é um tanto bagunçada.
Darei o benefício da dúvida da tentativa de simular a vida do protagonista que está pilotando um equipamento obsoleto, que não está na sua melhor forma, mas, ainda assim, há diversos fatores irritantes. Como em todo metroidvania que se preza, a alternância entre combate e plataformas é constante, e em ambas ocorrem problemas sérios de imprecisão de comandos.
Em alguns trechos com plataformas mais estreitas, a precisão dos saltos deixa bastante a desejar, muitas vezes indo além do necessário. Já na hora de acertar alguém, em diversos momentos acontece a confusão de estar muito longe para alcançar o inimigo e muito perto para levar dano, o que resulta em não acertarmos ninguém e ainda tomar uma paulada robótica. Essa questão se intensifica ao chegarmos na área do chefe, em que tudo requer um pouco mais de precisão e agilidade.
Esta é uma característica que o jogador pode, sim, acabar assimilando ao passar mais tempo explorando as ruínas, mas sempre vai ter aquele trecho que fica desnecessariamente mais longo e complicado por causa da física estranha. Não seria de todo mal se uma atualização fosse feita para que isso ficasse um pouco mais “firme”.
Por fim, um último ponto incômodo é que, se você morre em um local, o retorno é feito no checkpoint normalmente. Porém, tudo que você acumulou, como itens encontrados e coisas importantes para as missões secundárias, é perdido. Além disso, se você usou itens que recuperam a vida, ou algo do tipo, eles não retornam ao seu inventário, o que gera um pequeno, e desnecessário, lapso de roguelike.
Um coelho-dragão?
Rusty Rabbit investe bastante no aspecto de evolução e aprimoramento tanto de Stamp quanto de seu mecha, então é normal passar um bom tempo em outras áreas do jogo, como na loja e na sua garagem, vendo qual a melhor build para cada área. Isso exige conversar com muita gente, e é nessa hora que a dublagem (americana e japonesa) brilha com força.
Stamp tem a voz nipônica de ninguém mais, ninguém menos, que Takaya Kuroda, que dá vida ao Dragão de Dojima, Kazuma Kiryu(fato curioso: exatamente no dia de publicação deste texto, Kuroda está completando 60 anos. Parabéns!). Logo, é bastante curiosa essa assimilação, que reforça o tom do humor do jogo, que não é aquela coisa jocosa e sempre cheia de piadinhas “espertas”. Temos apenas um coelho velho que tem uma missão e ainda tem que lidar com um grupo de escavadores mais jovens que aparecem a todo momento para ajudar ou atrapalhar, mas sempre causando comentários ao estilo “estou muito velho para lidar com essa juventude”.
Além do protagonista, todas as cenas de fala têm uma dublagem bastante interessante e aumentam a imersão do jogador com a história, que infelizmente fica arrastada mais para o meio da aventura, por causa do tanto de interrupções de cenas durante as fases, que chega a ser um exagero. Não há nem textos em português, então quem não tem intimidade auditiva ou de leitura em inglês vai ficar meio perdido nos acontecimentos.
Por falar nas cenas, elas cumprem um bom papel, tanto nos diálogos, com ângulos de câmera trabalhados que passam até a sensação de um longa-metragem, quanto no andamento da ação, que já é mais tradicional, no estilo 2D com orientação lateral.
Outro destaque bacana fica por conta da comunidade na qual vive Stamp. Ela funciona como se fosse um hub que integra as áreas de interesse fora da ação, como loja, garagem e o bar, no qual verificamos as missões secundárias. Há também um café, no qual passamos por um pequeno minigame de relacionamentos, em que temos que puxar papo (a contragosto) com algumas pessoas para aumentar nosso grau de afinidade e ganhar recompensas; e a igreja, na qual podemos conhecer um pouco mais da história pregressa do que aconteceu com a Terra, ao custo da oferta dizimista de uma cenoura.
Tentando cavar seu lugar na prateleira
Rusty Rabbit não é ousado em sua proposta, mas também não faz feio. O jogo se cercou de ótimas ideias juntando metroidvania e ação com algumas pitadas de RPG e humor. Claro que a repetitividade massiva causada pelo backtracking e as falhas na jogabilidade podem causar uma certa exaustão, mas, ainda assim, é um título que recompensa quem chegar até o final com uma boa aventura.
Prós
- Diversos elementos de customização e escolha de habilidades aumentam o fator replay para quem for atrás de cada segredo;
- O estilo metroidvania é muito bem utilizado, casando ação e plataforma de maneira interessante;
- Excelente trabalho de dublagem em japonês e inglês;
- Visuais tridimensionais combinam com a história e o ambiente proposto, aumentando a imersão;
- Humor ranzinza, se aproveitando da idade do protagonista sem ser jocoso ou bobo.
Contra
- A física ao saltar e a distância para realizar ataques curtos são imprecisas;
- Excesso de diálogos em alguns momentos torna o ritmo de jogo arrastado;
- Ao voltar a um checkpoint por ter morrido, todo progresso conquistado nas missões secundárias após passar por ele é perdido, e itens consumidos não retornam ao inventário;
- Ausência de textos em português.
Rusty Rabbit — PC/PS5/Switch — Nota: 7.5
Versão utilizada para análise: PS5
Revisor: Ives Boitano
Análise feita com cópia digital cedida pela NetEase Games
Rusty Rabbit
7.5
PS5
Rusty Rabbit isn't bold in its proposal, but it's not bad either. The game has surrounded itself with great ideas, combining metroidvania and action with some RPG and humor. Of course, the massive repetitiveness caused by backtracking and the flaws in the gameplay can cause a certain exhaustion, but it's still a title that rewards those who make it to the end with a good adventure.