gamescom latam 2025: conversamos com os organizadores da Pesquisa Game Brasil sobre o mercado latino-americano de jogos

Durante a gamescom latam 2025, a equipe da Pesquisa Game Brasil (PGB)– realizada anualmente pelo SX Group e Go Gamers, em parceria com a Blend New Research e ESPM – divulgou os resultados de seu levantamento para mapear os hábitos de consumo do jogador latino-americano.Assim como no Brasil, o smartphone lidera como plataforma mais adotada em países como Argentina, Chile, Colômbia, México e Peru. Nesses mercados, exceto o mexicano, os Millenials (pessoas entre 30 e 44 anos) são a maioria dos consumidores.Enquanto isso, segundo dados divulgados pela PGB em março, 82,8% dos brasileiros afirmaram consumir jogos digitais, valor que foi alcançado, entre outros fatores, pela popularização de jogos de sorte no país.Para falar mais sobre os resultados encontrados nesses levantamentos, conversamos com Carlos Silva, coordenador da Pesquisa Game Brasil, e Mauro Berimbau, consultor da Go Gamers. Confira a entrevista completa, com edições para facilitar a leitura.GameBlast: Você afirmam que mais de 80% dos brasileiros dizem jogar algum tipo de jogo. Mesmo assim, ainda há um estigma sobre a imagem do jogador de videogame. Como há uma parcela tão grande de pessoas que jogam, mas ao mesmo tempo parece que existe um desconhecimento do mercado como um todo?Carlos Silva: A gente construiu a PGB em 2013 e percebemos nesses anos que tinha um território novo surgindo, que se consolidou, que é o consumo dos smartphones. O celular trouxe uma outra demografia, um outro tipo de perfil de consumo e ampliou ainda mais a quantidade de jogadores. Quando a gente pensa em games, no passado era consumidor de console e computador. Isso foi ampliado.O smartphone é o aparelho que está na mão de todo mundo. Você pode jogar agora se quiser. Quando a gente pensa nesse aspecto de população, mais de 80%, tem muita relação com isso. Games se tornaram relevantes para muito mais pessoas, quebraram várias barreiras, as pessoas começaram a consumir mais, se tornou algo cultural. Jogar já fazia parte do dia a dia de muitas pessoas, mas tornou algo muito maior nesse sentido. Saiu do nicho e entrou no mainstream.Então, hoje falar de games não é falar de algo totalmente desconhecido O que acontece é que hoje a indústria observa alguns territórios. Tem a indústria que olha o console, que olha o videogame, que olha o hardware, o acessório. A gente tem essas segmentações.Mas essa visão atual mais ampla do jogador, ela é importante porque a gente entende que games hoje conversam com todo mundo, com todo tipo de geração, de idade, conteúdo de gosto, inclusive. Hoje você tem um monte de possibilidades de jogos. Foram esses movimentos ao longo dos anos que trouxeram esse volume de jogadores, 82% que jogam, o que é bastante gente no Brasil.GameBlast: Vocês veem que existem pessoas que nem se identificam como jogadoras, mas quando elas param pra pensar, acabam reconhecendo que jogam?Carlos Silva: Isso tem a ver com o gamer. O Mauro explica muito bem esse ponto. Hoje, realmente, muitas pessoas jogam no celular, no notebook e tal, jogam todos os dias, gastam dinheiro às vezes. Você vê que tem um envolvimento, mas quando perguntamos "Você é gamer?", elas respondem "Não, eu não sou gamer". Mas a pessoa está ali consumindo tanto tempo quanto aquela outra que se reconhece como gamer.Só que o gamer tem um aspecto mais de identidade. Hoje você tem facilidade de acesso, mas não necessariamente você é o gamer, vai vir em uma gamescom para curtir games. Mas você vai jogar e joga com frequência. Você dedica o tempo. Isso é uma das coisas que mudaram nos últimos anos. Mas sobre o gamer, o Mauro tem uma definição muito boa para falar sobre isso.Mauro Berimbau: Eu sinto nas suas perguntas uma certa indignação, no sentido de "se somos 82% dos brasileiros jogando jogos digitais, por que a gente não vê isso mais presente em outros aspectos do dia a dia? Por que que isso parece, muitas vezes, uma coisa errada, uma brincadeira de criança?"Todos nós, profissionais, sofremos com isso. Faz parte do nosso papel, inclusive, com a Pesquisa, de tentar bater um pouco nessa tecla, destacar esses números para falar que nós não somos poucos.O perfil do gamer, esse sujeito que bate no peito, que se identifica com o consumo, é uma parte muito importante do consumidor de games. Assim como tem a pessoa que gosta de música ou de livros, isso faz parte da identidade da pessoa. Mas gamers também consomem produtos dessas outras mídias, que estão presentes no nosso cotidiano.Então, a nossa tentativa com a pesquisa é abrir um pouco os olhos tanto dos consumidores, mas principalmente da indústria, de que a cultura do game é muito mais importante do que atualmente nós estamos trabalhando.GameBlast: O smartphone mais popularizado faz com que as pessoas tenham mais contato com jogos, tornando esta a plataforma de games de maior acesso na América Latina. Dentro dessa realidade, quais são os desafios para os fabricantes de consoles para conseguir atrair o público latino-americano?Carlos Silva: Bom ponto. Eu vou

Mai 6, 2025 - 23:15
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gamescom latam 2025: conversamos com os organizadores da Pesquisa Game Brasil sobre o mercado latino-americano de jogos

Durante a gamescom latam 2025, a equipe da Pesquisa Game Brasil (PGB)– realizada anualmente pelo SX Group e Go Gamers, em parceria com a Blend New Research e ESPM – divulgou os resultados de seu levantamento para mapear os hábitos de consumo do jogador latino-americano.


Assim como no Brasil, o smartphone lidera como plataforma mais adotada em países como Argentina, Chile, Colômbia, México e Peru. Nesses mercados, exceto o mexicano, os Millenials (pessoas entre 30 e 44 anos) são a maioria dos consumidores.

Enquanto isso, segundo dados divulgados pela PGB em março, 82,8% dos brasileiros afirmaram consumir jogos digitais, valor que foi alcançado, entre outros fatores, pela popularização de jogos de sorte no país.

Para falar mais sobre os resultados encontrados nesses levantamentos, conversamos com Carlos Silva, coordenador da Pesquisa Game Brasil, e Mauro Berimbau, consultor da Go Gamers. Confira a entrevista completa, com edições para facilitar a leitura.

GameBlast: Você afirmam que mais de 80% dos brasileiros dizem jogar algum tipo de jogo. Mesmo assim, ainda há um estigma sobre a imagem do jogador de videogame. Como há uma parcela tão grande de pessoas que jogam, mas ao mesmo tempo parece que existe um desconhecimento do mercado como um todo?

Carlos Silva: A gente construiu a PGB em 2013 e percebemos nesses anos que tinha um território novo surgindo, que se consolidou, que é o consumo dos smartphones. O celular trouxe uma outra demografia, um outro tipo de perfil de consumo e ampliou ainda mais a quantidade de jogadores. Quando a gente pensa em games, no passado era consumidor de console e computador. Isso foi ampliado.

O smartphone é o aparelho que está na mão de todo mundo. Você pode jogar agora se quiser. Quando a gente pensa nesse aspecto de população, mais de 80%, tem muita relação com isso. Games se tornaram relevantes para muito mais pessoas, quebraram várias barreiras, as pessoas começaram a consumir mais, se tornou algo cultural. Jogar já fazia parte do dia a dia de muitas pessoas, mas tornou algo muito maior nesse sentido. Saiu do nicho e entrou no mainstream.

Então, hoje falar de games não é falar de algo totalmente desconhecido O que acontece é que hoje a indústria observa alguns territórios. Tem a indústria que olha o console, que olha o videogame, que olha o hardware, o acessório. A gente tem essas segmentações.

Mas essa visão atual mais ampla do jogador, ela é importante porque a gente entende que games hoje conversam com todo mundo, com todo tipo de geração, de idade, conteúdo de gosto, inclusive. Hoje você tem um monte de possibilidades de jogos. Foram esses movimentos ao longo dos anos que trouxeram esse volume de jogadores, 82% que jogam, o que é bastante gente no Brasil.



GameBlast: Vocês veem que existem pessoas que nem se identificam como jogadoras, mas quando elas param pra pensar, acabam reconhecendo que jogam?

Carlos Silva: Isso tem a ver com o gamer. O Mauro explica muito bem esse ponto. Hoje, realmente, muitas pessoas jogam no celular, no notebook e tal, jogam todos os dias, gastam dinheiro às vezes. Você vê que tem um envolvimento, mas quando perguntamos "Você é gamer?", elas respondem "Não, eu não sou gamer". Mas a pessoa está ali consumindo tanto tempo quanto aquela outra que se reconhece como gamer.

Só que o gamer tem um aspecto mais de identidade. Hoje você tem facilidade de acesso, mas não necessariamente você é o gamer, vai vir em uma gamescom para curtir games. Mas você vai jogar e joga com frequência. Você dedica o tempo. Isso é uma das coisas que mudaram nos últimos anos. 

Mas sobre o gamer, o Mauro tem uma definição muito boa para falar sobre isso.

Mauro Berimbau: Eu sinto nas suas perguntas uma certa indignação, no sentido de "se somos 82% dos brasileiros jogando jogos digitais, por que a gente não vê isso mais presente em outros aspectos do dia a dia? Por que que isso parece, muitas vezes, uma coisa errada, uma brincadeira de criança?"

Todos nós, profissionais, sofremos com isso. Faz parte do nosso papel, inclusive, com a Pesquisa, de tentar bater um pouco nessa tecla, destacar esses números para falar que nós não somos poucos.

O perfil do gamer, esse sujeito que bate no peito, que se identifica com o consumo, é uma parte muito importante do consumidor de games. Assim como tem a pessoa que gosta de música ou de livros, isso faz parte da identidade da pessoa. Mas gamers também consomem produtos dessas outras mídias, que estão presentes no nosso cotidiano.

Então, a nossa tentativa com a pesquisa é abrir um pouco os olhos tanto dos consumidores, mas principalmente da indústria, de que a cultura do game é muito mais importante do que atualmente nós estamos trabalhando.

GameBlast: O smartphone mais popularizado faz com que as pessoas tenham mais contato com jogos, tornando esta a plataforma de games de maior acesso na América Latina. Dentro dessa realidade, quais são os desafios para os fabricantes de consoles para conseguir atrair o público latino-americano?

Carlos Silva: Bom ponto. Eu vou emendar aqui com a questão que a gente mapeou no recorte geracional. A gente pegou a geração alfa. A gente não entrevista crianças e adolescentes, mas a gente entende o comportamento deles por meio dos pais que respondem a pesquisa.

A principal plataforma da faixa etária dos 10 aos 15 anos é o console. Se a gente for voltar alguns anos, essa criançada não tinha um console, talvez, para poder jogar. Mas, com o passar do tempo, vai se envolver por meio do smartphone, do tablet, vai entendendo sobre jogos. Aí surge a vontade de experimentar outras coisas, um PC, um PlayStation, um Xbox.

A gente percebe que existem, sim, essas possíveis migrações de interesse. O desafio é como fazer essa migração. Como entregar produtos atrativos para esse público que está no smartphone? Há vários desafios.

O primeiro deles é que há barreiras de acessórios e equipamentos mesmo, se pensar no aparelho, mas também até de valores. Se você pensar no modelo de negócio do smartphone, os jogos são gratuitos. Você até paga o custo dentro do game, mas é um custo diferente de você comprar um ecossistema para jogar. Se você quiser montar um PC, precisa comprar acessório, cadeira, bancada, assinatura e depois o jogo. É muita coisa.

O desafio da indústria, na minha visão, é conseguir ser atrativa com uma oferta de ecossistema para esse público também consumi-la. Por isso o smartphone é tão relevante. É seu o modelo de negócio, é a estrutura que ele tem, o ecossistema que permite um acesso maior. Isso faz ele ser relevante, mas as pessoas têm interesse em jogar no console ou no computador.



Mauro Berimbau: Permite uma provocação? A indústria grande não está olhando para os jogadores de smartphone, salvo, talvez, a Nintendo. A Nintendo talvez seja uma empresa que está tentando atuar – desde o Nintendo Wii, vamos combinar – exatamente em um território de alguém que não é só o gamer.

Por que um videogame ou um jogo digital não pode ser algo como era no seu princípio, nos anos 1970, 1980? Algo inclusivo para todos? Jogos se tornaram um negócio que você tem que ter uma habilidade. Ao começar a jogar hoje um Call of Duty, por exemplo, se você não tem a experiência de ter jogado outras coisas, de saber das teclas WASD, do mouse, de entender certos aspectos da interface para ser minimamente competitivo, você nem entra.

Os jogos de smartphone entraram e pulverizaram tão rapidamente não só por uma questão de preço, mas porque eram muito fáceis de você usar, de você começar. Tem várias barreiras caindo por causa isso. Para mim, parece que a Nintendo, arrisco dizer, é a única empresa que está efetivamente olhando para essa margem das pessoas que estão entrando Você tem uma estrutura marginal que dá a possibilidade para as pessoas brincarem de várias maneiras, desde com os jogos mais complexos, até com os jogos mais simples, como o Nintendo Switch Sports.

GameBlast: O que provoca o estigma que vemos em jogos mobiles? Temos muitas pessoas que estão jogando no celular, mas existe ainda uma imagem de que jogos mobile são "menores".

Carlos Silva: Eu penso que talvez a simplicidade dos jogos, a forma como eles são construídos, passa um pouco dessa impressão, mas isso não quer dizer que são jogos ruins.

Se você tem uma mecânica que funciona melhor com determinado público – por exemplo o do smartphone – aquele público está mais propenso a engajar com esse jogo, pois ele pode ser mais fácil de você se conectar e jogar, característica que pode ser diferente para o PC ou o console. Mas isso não quer dizer que, de novo, os jogos são ruins, ou que eles não sejam complexos.

Se você pegar, por exemplo, um Call of Duty Mobile, você tem um monte de menu, um monte de interação e tudo mais, que não chegam a ser complexos como no computador, mas o jogo tem um nível de entendimento, e tudo bem. Tem uma galera que topa isso.

Hoje eu vejo que as pessoas, principalmente que jogam no console ou no computador, têm preconceito contra "joguinho de smartphone", mas não param para analisar, de fato, como esses produtos são tão divertidos e tão bem feitos quanto o jogo AAA. É uma questão de percepção.

A gente nunca vai conseguir comparar. Os Call of Duty de celular, PC e consoles nunca vão ser iguais.
Mas, para quem tem um smartphone e consome o Call of Duty, ele é bom demais. E ele é legal demais também a versão do jogo para outras plataformas. A gente tem que parar um pouco com essa leitura de ficar comparando.

É uma coisa única. O smartphone é smartphone. Está tudo bem ter marcas e franquias no mobile, mas lembre que o jogo para dispositivos móveis não será o mesmo que o jogo de console. Se você tiver isso em mente, você vai ter uma experiência muito melhor. Os jogos têm uma característica diferente de produção mesmo.

Mauro Berimbau: Carlão, tem uma questão de cultura que é muito complicada. Tem vários fatores que envolvem isso. Pensa o seguinte: qual o seu jogo favorito?

GameBlast: Gosto muito de jogos Zelda. 

Mauro Berimbau: Zelda. Quantos anos das nossas vidas nós não dedicamos para jogar Zelda, e passamos por um jogo e outro. Aprendemos quem é Zelda, aprendemos quem é Ganondorf, aprendemos sobre a Triforce. Tanto a gente aprendeu sobre isso que, sendo ser gamer um aspecto tão importante para a minha identidade, ao chegar alguém que joga um jogo de smartphone, por exemplo Candy Crush, "casualmente" – que também é uma palavra pejorativa, pois a pessoa joga até mais que eu que jogo Zelda. Mas é só um "joguinho de celular".



O gamer pode pensar: "há anos que eu invisto, que eu estudo, que eu aprendi as mecânicas, que eu participo, sei quem são as pessoas da indústria, sinto orgulho de participar desse processo. Você, jogador casual, acabou de chegar e vem falar que é gamer também?". Sem culpar os gamers, acho que é um movimento da cultura. Algo novo aparecendo que, de alguma maneira, põe em cheque quem sou eu. 

A tendência é afastar aquele que põe em cheque quem eu sou. Isso acontece com fãs de Marvel, por exemplo. A gente viu, quando surgiu o universo cinematográfico da Marvel, os fãs dos quadrinhos da Marvel dizendo "Vocês não são fãs de Marvel. Vocês são fãs do MCU". Criou-se uma palavra que separou os grupos.

Isso é um movimento que a gente vê da cultura mesmo, e que é um sinal, na verdade, que a cultura gamer cresce. Esse crescimento causa fragmentações, rupturas, possibilidades diferentes. É uma coisa muito ruim, mas que, no fundo, é um bom sinal.

Carlos Silva: Vai chegar um ponto que talvez a gente não tenha essa discussão. Acho que a partir do momento que a gente vê as pessoas entendendo que isso tudo faz parte, está tudo bem.

GameBlast: Então isso se diluiria com a passagem de gerações?

Carlos Silva: É bem possível porque, se você pegar o recorte que a gente faz de gerações, por exemplo, as gerações Z e Millenials, por exemplo, são públicos muito mais conectados com a cultura gamer. Eles nasceram no mundo digital, games estão aí o tempo inteiro para todo lado, diferente de outras gerações mais velhas que não tiveram essas experiências. 

Possivelmente, conforme as gerações forem envelhecendo, quando a geração Z tiver seus 50 anos, essa percepção poderá ser diferente. Porque eles entendem que o smartphone é importante. É a principal plataforma deles, inclusive. Então, quando chegarmos lá, talvez se tiver uma outra plataforma, a gente possa voltar a discutir. Mas, até lá, estamos falando da mesma coisa, porque já cresceu o meio cultural. O smartphone está aí.

Hoje, se você olhar aqui na própria gamescom, a gente tem poucos jogos no mobile, mas já estão surgindo. Daqui a pouco, a gente vai ter um espaço onde vai ter tudo misturado e está tudo bem. Acho que vai ser um movimento cultural, como o Mauro falou. Ele vai caminhando, ano após ano, até realmente se tornar uma coisa mais latente.

Quando a gente começou a PGB dez anos atrás, essa população de jogadores, não era isso. Eu me lembro de um dado de que quem se declarava gamer era menos de 12%. Hoje é quase metade já. Você vê, dez anos. Então, vamos viver um pouco desse movimento ainda.

Mauro Berimbau: E cabe a nós, da indústria, cabe a lutar bravamente e insistir de que game não é só um joguinho. Game é cultura, é possibilidades, é aprendizagem, é desenvolvimento, é passatempo também. É mais rico do que a gente enxerga, faz parte da nossa vida.

GameBlast: Recentemente estamos vendo um crescimento de entretenimento digital misturado com apostas envolvendo dinheiro real. Como vocês veem o avanço desse tipo de interface e sua interpretação como jogo digital? 

Mauro Berimbau: É polêmico porque é um jogo digital, mas não é videogame como a gente está discutindo. O que a gente percebe dos dados das pesquisas, a gente chegou a 82% de pessoas que jogam. A primeira coisa que a gente fez quando viu esse número foi achar que erramos porque o número sempre foi 70%, 72%, e de um ano para o outro subiu. Mas o que é curioso é que a pergunta que a gente faz é: "Você joga algum jogo digital?"

Mais para a frente na pesquisa, a gente percebe que quando a gente pergunta sobre jogos de sorte, esse número cresce. Então, fica evidente que esse tipo de prática, para quem joga, acaba sendo uma porta de entrada para o hábito de consumir jogos digitais. Pode ser que a pessoa fique aí; pode ser que ela migre para outros jogos; pode ser que ela já seja, na verdade, uma jogadora que quer apostar para aumentar a emoção de assistir um esporte, por exemplo. A gente também mede na pesquisa os motivos pelos quais as pessoas apostam.

O comportamento de consumo dos jogos digitais, ele é mais amplo na cultura e mais presente, ao ponto de certas pautas políticas serem direcionadas para esse público, independente do governo vigente. Porque entende-se que esse é um comportamento recorrente comum, que gira na sociedade e que faz parte da nossa cultura de consumo. Não é algo a ser ignorado.



Carlos Silva: A gente decidiu explorar esse território porque essa categoria tem se posicionado como jogo. É o jogo do tigrinho. Talvez, para algumas pessoas, ela associa-se ao jogo.

Quando você pega as motivações, que é o que chama muita atenção, a maioria é para gastar dinheiro, para apostar. Mas, tem gente joga para se distrair, para relaxar, para passar o tempo. O dinheiro torna a coisa mais emocionante. Mas você pode se emocionar jogando um Zelda também. Então, você vê que a questão do engajamento já começa a ser diferente. Não é só a questão da aposta, do dinheiro. 

Se você pegar a interface do jogo do tigrinho, colocar ao lado da do Candy Crush, o que muda entre elas? De um lado, você tem os brigadeiros que você faz as combinações. Do outro, você tem o dinheiro que você está investindo. Mas a camada de gamificação está ali. Então, as pessoas podem criar essa associação a um jogo.

Por mais que a gente pense games como entretenimento, franquias, narrativa, essa categoria de apostas está conseguindo gerar interesse. Cabe a nós entender o efeito disso. Como isso vai acontecer ao longo desse ano? Com a regulamentação. Esses jogos, essa categoria vai continuar existindo? Vai ter que se chamar de outro jeito? A gente não sabe.

O que a gente sabe agora é que, sim, essa categoria está impactando e está mexendo com esse consumidor. Não acho que quem consome games vai trocar o Call of Duty pelo jogo do tigrinho. Mas talvez a atenção dele esteja nos dois tipos de jogo porque os dois têm propostas diferente.

São coisas que a gente vai entender também como vão se desenrolar nos próximos anos. Mas foi uma primeira leitura interessante para entender principalmente motivações.

GameBlast: Falando da questão de dinheiro, estamos vendo uma tendência de aumento de preços de games nos Estados Unidos, na Europa. Como que esses aumentos refletem aqui na América Latina?

Carlos Silva: O que a gente pode dizer historicamente? Existe um comportamento médio de gastos em jogos ao longo de muitos anos da PGB. O brasileiro hoje, por exemplo, compra três jogos em média por ano. Mas o que são esses três jogos? São lançamentos? São jogos em promoção? São jogos pagos no celular? Podem ser várias coisas.

A gente vê que o brasileiro ao longo dos anos, ele continua se envolvendo, continua gastando. Se você segmenta a galera de console e computador, é a mesma coisa. O que eu vejo? Se você tiver uma franquia pela qual é muito apaixonado e quiser muito jogar, você vai de alguma forma se adaptar aos custos. O jogador brasileiro vai encontrar maneira de jogar. Ele vai encontrar maneira de consumir.

Nintendo Switch 2 a quase R$ 5 mil? Faço em 24 vezes e eu não vou deixar de jogar o meu Zelda. A gente também vive um pouco desse dilema em que a gente vai questionar os preços, porque a gente quer uma coisa mais acessível pra nós e pra mais pessoas, consequentemente, mas o fã vai se envolver. Ele vai continuar comprando.

Os US$ 80 vão fazer com que os jogos caiam no patamar de R$ 500, que é o que aconteceu com o Nintendo Switch 2 agora. É um terço do salário mínimo. Se você pega hoje a renda familiar, pelo que a gente mapeia na PGB, realmente vai morder uma fatia significativa do dinheiro da pessoa. Mas o jogador vai encontrar uma maneira. Talvez ele compre menos jogos, talvez ele gaste menos porque ele vai ser mais seletivo, mas ele não vai deixar de se engajar.

Ele vai comprar o jogo depois de um certo tempo. A gente vê, inclusive na segmentação de plataformas, as pessoas comprando jogos depois de seis meses, um ano e está tudo bem  Porque para elas ainda é algo interessante. Não importa se perdeu o hype.
O jogador está comprando algo que vai ser mais adequado para o valor que ele tem para gastar com games.

Então, o aumento de preço vai ter um impacto, mas o brasileiro vai encontrar um jeito.

Mauro Berimbau: É que acontece historicamente. Desde os anos 1980, quando a indústria dos eletrônicos começou a surgir no Brasil com mais força, os primeiros videogames que surgiram foram os clones.

Quando a gente teve a oportunidade de conversar com o time da Capcom, estávamos apresentando a Pesquisa Game Brasil para eles, e falamos assim: "Sabe como que a gente teve acesso aos grandes nomes da Capcom? Com esse aparelho aqui, o Phantom System". Os aparelhos da CCE, os Famiclones.

Olha só que interessante, a própria indústria dava um jeito de fazer o negócio acontecer. Existia e existe uma demanda. A América Latina é consumidora, é jogadora, gosta de games.

Preços são um impeditivo, uma barreira? São. Mas isso também começa a oferecer oportunidade, em comparação, pra outros players desse setor. Se eu produzo jogos de smartphones, de repente, vejo a oportunidade de a pessoa estar mais apta a gastar em jogos desse segmento. Os jogadores podem começar a olhar mais para a indústria independente.

A gente vai achando jeitos, como a gente sempre achou historicamente, inclusive com o PlayStation 1, 2, 3 no Brasil. Achamos um jeito de consumir. O primeiro Playstation oficial que tivemos no Brasil foi o 3 em 2010, se não me engano. Achamos um jeito. Acho que o latino em especial, em várias áreas de consumo, faz isso. Mas a gente não deixa de consumir.

GameBlast: Muito obrigado pela conversa!