Micro$oft 50 Anos – a empresa que mudou o mundo – Parte 4
Descubra como a Microsoft usou táticas legais e nem tão legais para combater concorrentes e ganhar mercado. Venha conhecer a história fascinante dessa gigante! Micro$oft 50 Anos – a empresa que mudou o mundo – Parte 4

A importância da Microsoft para o mundo da TI, para o mundo como um todo é inegável, mas não sejamos inocentes. Eles não eram santos abnegados buscando melhorar a Humanidade, como os astronautas de Star Trek – Também não eram o império do Mal que a turma do Linux vendia. Não que fossem santos, muito pelo contrário.
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Gates of Borg, revivendo um meme clássico. (Crédito: Editoria de Arte)
A Microsoft usou de muitas táticas, legais e nem tão legais, para combater concorrentes, ganhar mercado e evitar competição. Algumas foram atitudes essencialmente mesquinhas, mas para o bem ou para o mal, fazem parte de sua História. Vamos conhecer alguns desses momentos, sem ordem cronológica explícita.
1 – A Carta
A Micro-Soft surgiu com o Altair BASIC, escrito por Bill Gates e Paul Allen para o Altair 8800. Ele era bem caro. Custava US$60 para quem tinha um Altair, ou US$500 para quem não tinha. Em valores de 2025 esses U$60 equivalem a US$350, uma grana que a maioria dos estudantes não tem.
Isso resultou em um monte de gente querendo brincar com o BASIC, mas sem dinheiro. Para sorte desses, a pirataria ainda estava sendo inventada, então técnicas anti-pirataria ainda estavam no Futuro. Rapidamente o povo começou a copiar o código do BASIC da Microsoft, era tão simples quanto ligar um leitor de fita perfurada em um perfurador de fita.
Bill Gates subiu nas tamancas, escreveu uma longa carta condenando a prática, acusando os piratas de roubo, dizendo que a pirataria iria inviabilizar a indústria de software comercial.
A carta foi publicada em várias revistas, e deixou a Comunidade possessa. Ninguém estava revendendo o BASIC, a maioria não tinha noção da complexidade e custos envolvidos, eram hobbystas e fuçadores compartilhando conhecimento.
A Carta foi a primeira atitude antipática da Microsoft, a gênese da antipatia que muita gente até hoje sente pela empresa.

A clássica carta de Bill Gates (Crédito: Reprodução Internet)
2 – A Fuleragem do DR-DOS
Existiam duas versões oficiais do MS-DOS: O PC-DOS da IBM, e o MS-DOS da Microsoft. Fora isso você tinha versões compatíveis, desenvolvidas independentemente da Microsoft, e até absurdos como uma versão brasileira, cujo nome não será citado por motivos de Processinho.
Essa versão brasileira, aplaudida pelo povo da Reserva de Mercado da Informática como exemplo da Indústria Nacional, sempre era atualizada alguns dias após a Microsoft atualizar o MS-DOS. Entre as curiosidades da versão brasileira, nas mensagens “Deseja continuar, (S/N)”, se você apertasse “S”, nada acontecia. Apertando “Y”, continuava.
Um dos clones mais populares era o DR-DOS que todo mundo chamava de Doutor DOS mas era DR de Digital Research, a empresa que criou o software.
Quando a Microsoft anunciou o Windows 3.1, viu que tinha potencial de vender horrores, e como o Windows rodava em cima do DOS, eles faturariam uma venda dupla. Exceto que o DR-DOS era popular, mais barato e o primeiro 100% compatível.
Para evitar que o DR-DOS, que na época tinha 6% do mercado comesse uma fatia maior, a Microsoft começou uma campanha onde não divulgava compatibilidade do DR-DOS com o futuro Windows 3.1 para os integradores, anunciava futuras versões do MS-DOS com recursos muito superiores ao DR-DOS (mas que eram puro vaporware) e chegaram ao ponto de incluir uma sub-rotina no instalador do beta do Windows 3.1 especialmente para o DR-DOS.
Quando o instalador detectava que estava rodando em cima do DR-DOS, interrompia com uma mensagem de erro:

O "Erro" do DR-DOS (Crédito: Reprodução Internet)
“Non-fatal error detected: Error number [varied]. Please contact Windows 3.1 beta support. Press enter to exit or C to continue.”
Não era um erro, não havia nenhum problema, a mensagem foi criada para promover Medo, Incerteza e Dúvida, (FUD, em inglês), termo que se popularizou com o Processo movido pela Caldera (a então proprietária do DR-DOS), que cansou das táticas mesquinhas da Microsoft.
Quando do lançamento do Windows 3.1, a mensagem não aparecia mais, mas para alegria dos advogados da Caldera, os programadores preguiçosos da Microsoft só removeram a chamada de execução, o código continuava presente nas bibliotecas do Windows. O resultado foi um acerto extrajudicial onde a Microsoft pagou à Caldera o equivalente a meio bilhão de dólares, em 2025.
3 – Matando o WordPerfect
Houve uma época em que existia UM editor de textos em IBM-PCs, o WordStar. O resto era o resto. Em qualquer lugar do planeta, se você abrisse a janela e perguntasse “Como marco bloco?” as pessoas gritariam em conjunto “CONTROL + KB!!!!”. Distante em segundo lugar, vinha o WordPerfect, e comendo pelas beiradas, o Microsoft Word.
Nota: No Brasil, graças à Reserva de Mercado, era muito popular um programa bizarro chamado Carta Certa, que usava tags, como um precursor do HTML, então seu texto estaria escrito normalmente nas se quisesse uma palavra em Sim, eu achei o Carta Certa no Internet Archive e rodei no DOS Box. (Crédito: Editoria de Arte) O Carta Certa também usava, por algum motivo, a tecla ESC para acionar o menu. Um belo dia rolou um pequeno escândalo, quando descobriu-se que um Tribunal do Rio usava o Cara Certa, e o software tinha um programinha auxiliar para Jogo do Bicho.
De volta à Microsoft: Enquanto preparavam o lançamento do Windows 3.0, internamente desenvolviam o Word for Windows, que desde sua primeira versão era um programa bem ajeitadinho. A turma do WordStar não se interessou, acharam que tinham um virtual monopólio, ninguém pagaria de novo para uma versão Windows que só era mais bonitinha.
Já o povo do WordPerfect correu para desenvolver uma versão Windows. Exceto que a Microsoft enrolava para divulgar a documentação, propositalmente fornecia uma API pela metade, e reservava funções otimizadas e recursos avançados somente para seus desenvolvedores internos.
O resultado foi um WordPerfect for Windows que estava longe de ser perfeito. Era bugado, lento, travava direto. Com muito dedo da Microsoft no meio, versões que funcionavam 100% no último Beta do Windows 95 (sim, a perseguição durou bastante) não funcionavam na versão final.
A Novell comprou o WordPerfect em 1994, vendeu para a Corel 18 meses depois. Em 2009 processaram a Microsoft, mas o processo não deu em nada. Nada é o marketshare do WordPerfect, que ainda existe, não que alguém saiba o motivo.
Quem começou agora no mundo da TI não imagina que a Microsoft, que investe e apóia milhares de projetos Open Source, banca do próprio bolso o GitHub, seria contra essa modalidade de software, mas antigamente Software Livre, Open Source e Linux eram odiados. Steve Ballmer chegou a descrever Linux como “comunismo”, e era missão da Microsoft destruí-lo.
Um meme da época (Crédito: Arquivo pessoal) A Microsoft usou de várias estratégias para atacar o Linux. Não divulgava APIs e informações para que desenvolvedores criassem drivers para que o Linux acessasse partições FAT/FAT32/NTFS, não compartilhava protocolos de autenticação de rede.
Junto aos integradores, a Microsoft instituía um modelo de licença onde o fabricante pagava royalties do Windows para cada máquina vendida, não cada máquina vendida com Windows, então não havia incentivo para vender máquinas com Linux.
Em 1998 o lendário Eric S. Raymond, autor da Bíblia do Movimento Open Source, A Catedral e o Bazar, divulgou os chamados Documentos Halloween, uma série de memorandos e e-mails internos da Microsoft, discutindo os riscos e as estratégias para minar o Open Source.
SCO
Em 2003 a SCO iniciou uma série de processos contra empresas distribuidoras de Linux e até ex-clientes que agora usavam a plataforma. A alegação era que o Linux violava patentes e copiava código-fonte do Unix, mas a SCO se recusava a dizer qual código havia sido copiado, alegando só informar em Juízo.
Basicamente todo mundo foi envolvido nesse imbróglio legal, SCO processou IBM, SCO processou Daimler-Chrysler, SCO processou Novell, Novell processou SCO, RedHat processou SCO... em um ponto descobriu-se que a SCO antes de mudar de nome se chamava Caldera e entre 1994 e 1998 foi grande contribuinte pro código-fonte do Linux. A SCO estava em teoria processando a si mesma. O termo técnico é “rebuceteio”.
Dizem as más-línguas que a Microsoft ajudou a financiar os processos da SCO, como forma de mostrar o Linux como legalmente perigoso. Só se sabe que no final a SCO se enforcou em custas legais, alguns processos continuam até hoje. A taxa de sucesso da SCO nos tribunais permanece em 0%.
Outro meme da época, surpreendentemente preciso (Crédito: Arquivo pessoal) Patentes
Em 2006 a Microsoft anunciou um acordo de interoperabilidade com a Novell. As duas empresas compartilhariam o portfólio de patentes, Linux (ao menos o SUSE, da Novell) seriam amiguinhos, rodando virtualizados um no outro.
Os clientes de ambas as empresas receberiam garantia de que não teriam conseqüências legais de disputas de patentes, e seria uma ponte entre o software proprietário e o Open Source. Lindo, certo?
Em 2007 a Microsoft publicou um comunicado alegando que ferramentas Open Source violavam 235 patentes da empresa, a saber:
A Microsoft ameaçou processar todo mundo, integradores, usuários, fabricantes de variedades diversas de Linux, o pipoqueiro da esquina, todo mundo. Só que ficou muito evidente o desejo de trabalhar o FUD, pois - esse é o ponto-chave - a Microsoft não divulgou quais patentes haviam sido infringidas.
Linus Torvalds rodou a baiana, dizendo que sem saber onde estava o problema não tinham como consertar. Mark Shuttleworth, o cara do Ubuntu, chamou a atitude de “terrorismo de patentes”.
Como um todo a Comunidade pagou pra ver, e a Microsoft acabou reconhecendo o blefe. Ninguém foi processado.
Abraçar, Estender, Extinguir. Por muito tempo foi a filosofia da Microsoft para lidar com padrões que não estavam sob seu controle. Primeiro ela chegava dizendo ser favorável aos padrões abertos, como o HTML, em seguida começava a acrescentar tags proprietárias.
Em defesa da Microsoft, a Netscape fazia a mesma coisa, mas nessa época o Internet Explorer era o padrão de facto para navegadores de Internet, e as tags proprietárias eram efetivamente úteis. Quando a Microsoft incorporou controles ActiveX no Internet Explorer ele fazia coisas que até o Diabo duvidava, e na época Ele provavelmente tinha uma sala em Redmond.
Eu vi, meninos em vi, em 96 ou 97 uma pagina web aberta no Internet Explorer, mostrando uma tabela, linkada a uma planilha do Excel. A planilha era alterada, a tabela na página mudava. SEM RELOAD. Naquela época isso era pura macumbaria.
Claro, com o crescimento do Netscape a vida dos desenvolvedores virou um inferno, tínhamos que escrever sites duas vezes, nada era compatível entre ele e o Explorer. E tem o Java, ah, o Java...
Ah o Java...
Quando a Sun lançou o Java, em 1995, a proposta era licenciar o Java Runtime Environment (JRE), e distribuir os SDKs de desenvolvimento. Em teoria, você escreveria seu programa uma vez e ele rodaria em qualquer máquina com um runtime Java.
A Microsoft decidiu incluir suporte a Java no Windows, e atendeu todas as especificações da Sun, com um JRE totalmente compatível e certificado.
Aí a Microsoft incorporou a Microsoft Java Virtual Machine (MSJVM) no Internet Explorer 3, e todo mundo descobriu que além da implementação oficial do Java, eles incluíram várias extensões, que quebravam compatibilidade com o padrão. Programas escritos pro Java da Microsoft só rodavam no Windows, com o MSJVM.
A Sun entrou na Justiça, e depois de duas ações, em 2004 a Microsoft acertou um acordo onde pagou à Sun US$1,6 bilhões.
Com o tempo a Microsoft foi mudando sua postura. Com a saída de Steve Ballmer e Bill Gates, a empresa passou a ser gerenciada de forma bem menos visceral, e nosso indiano preferido, Satya Nadella, administra a gigante de Redmond com o cérebro, não com as gônadas (na minha metáfora gônadas são vísceras, me deixa!).
O Linux havia conquistado seu lugar no Datacentre (no Desktop só ano que vem), e a Microsoft não queria perder receita do Azure oferecendo soluções somente Windows. Projetos de interoperabilidade foram criados.
Ela também patrocina diretamente diversos projetos Open Source. Desde 2006 são patrocinadores nível Visionário da Python Software Foundation, com cota de US$ 160 mil/ano, além de patrocinar eventos como a PyCon e contratar desenvolvedores-chave do projeto, como Guido van Rossum, criador do Python.
A Microsoft adquiriu o GitHub em 2018, por US$ 7,5 bilhões. O site estava dando prejuízo e com risco de fechar. Com o investimento, as preocupações se acabaram e hoje o GitHub suporta mais de 100 milhões de desenvolvedores Open Source.
Esse investimento criou algo fora do comum; o ambiente Windows é estranhamente bem-visto e receptivo ao desenvolvimento e execução de aplicações de ponta em Inteligência Artificial. Ferramentas como PyTorch, TensorFlow, Transformers, CUDA, tudo roda muito bem em Windows, é raro o pacote que tenha Linux como exigência. Curiosamente só tive problemas com um pacote linux-only desenvolvido... pela Microsoft.
Sim, isso aconteceu (Crédito: Microsoft) E mesmo nesses casos, sempre pode-se usar o O WSL, ou Windows Subsystem for Linux, uma máquina virtual profundamente integrada ao sistema operacional, que permite baixar distros Linux direto da Loja da Microsoft, e executar diretamente dentro do Windows.
Em 2014 a Microsoft lançou a campanha Microsoft No próximo artigo, falaremos sobre como a Microsoft seria a empresa mais amada do planeta, se somente fabricasse hardware.
4 – Microsoft vs Linux
5 - Embrace Extend Extinguish
Uma Luz no Horizonte
Linux, e vem correspondendo. Se é amor de verdade ou puro interesse, não sei e não me importo, o mundo está muito melhor sem toda a bile gasta nessa briga idiota.
Next Week...